Assim que tomei o artigo de Suely Rolnik para leitura tive a sensação que entraria num mundo sem volta. Mundo onde a reflexão seria algo inevitável, pois conheço bem o meu coração inquieto frente às mazelas contemporâneas que estão deflagrando em mais mortes do que qualquer outra guerra na História.
As batalhas subjetivas estĂŁo provocando um "rombo" inestimável nas famĂlias e isso precisa ser mais articulado sobretudo nos espaços de ensino. Muito bem. O texto abrange o tema subjetividade em tempo de globalização com uma linha de raciocĂnio bem linear ao afirmar que a tendĂŞncia atual pela busca de sentido de "ser" frente ao sentido global e flexĂvel, esvazia o processo de criação e de pensamento. Logo, o sentimento de "vazio existencial" provocado pelo sistema de globalização, que almeja planificar as culturas acabam por trazer conceitos negativistas para a subjetividade. Assim termos como desassossego, inquietude, tristeza e atĂ© o sentimento de morte (como alerta a autora) sĂŁo somados ao conceito de subjetividade.
Na tentativa de "curar" essa falsa realidade as pessoas tendem a inclinar-se para as drogas que se dispõem a trazer um estado de prazer e uma zona de conforto com o objetivo (torno a dizer: falso) de trazer algum sentido de identidade. Nesse "kit de drogas" estão todo tipo de artificialidade e apatia tendo o mercado como "chefe" fazendo com que até o puro sentimento torne-se produto e os conceitos mais valiosos sejem depreciados. "Na contagem dos ovos" como dizia minha avó, vai restar pouca coisa desse ser humano. Freud quando diz a enigmática frase na Conferência XXXI: "Wo Es war, soll Ich werden", numa melhor tradução: "Ali onde isso fala, devo advir" acaba sintetizando a própria psicanálise dando à ciência um caráter de adaptação, ou seja, "o ego deve ocupar o lugar do id". A objetividade trazida pela inversão dos valores comerciais e "globais" faz com que a reflexão estendida seja trazida para o campo da praticidade buscando "verdades", "tratamentos" e "soluções".
Nessa luta desenfreada pelo sucesso, pelo corpo perfeito, pelo equilĂbrio mental, pela forma articulada de oratĂłria, a pura essĂŞncia do ser e a busca pela transcendĂŞncia se esvai. A procura pela identidade deve ser um processo, uma busca pessoal que nenhum livro de auto ajuda pode revelar, pois o que somos Ă© tĂŁo complexo que sĂł a alma sensĂvel Ă© capaz de decodificar. Para os que almejam essa humanização, dedico os trabalhos de AdĂ©lia Prado que numa ação eficaz dá dicas de simplicidade e coragem. Na sua obra "Bagagem" (1976) nos convida para a percepção do cotidiano e no final dessa aventura literária uma descoberta sensacional: a metafĂsica se revela no real. Para aguçar nossa subjetividade trago "Solar":
"Minha mĂŁe cozinhava exatamente:
arroz, feijĂŁo-roxinho, molho de batatinhas.
Mas cantava."