Ditadura não se comemora
março 31, 2019
Triste dia. A extrema direita brasileira, obcecada pela redefinição da História, conseguiu com que a Justiça Brasileira derrubasse uma liminar sob o argumento de que existia um erro de procedimento. De fato, a Defensoria Pública da União está atrelada em suas competências a promover ação civil pública a grupo de pessoas hipossuficientes. Vide o regimento interno no link: http://www.justica.gov.br/Acesso/anexos-institucional/ri-defensoria-publica-da-uniao-dpu.pdf
A Advocacia Geral da União argumentou que a DPU extrapolou as suas funções, pois não há necessitados na demanda. Seguiu afirmando ainda que o Presidente da República possui poder discricionário e pode atuar conforme a legislação. Realmente inexiste no ordenamento jurídico qualquer proibição de se "comemorar" ou "rememorar" o golpe militar de 1964. O que há é o artigo 287 do Código Penal que diz:
CP - Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940
Art. 287 - Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime:
Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.
Quadrilha ou bando
Neste sentido, o Presidente da República está autorizado a promover o seu ato discricionário. Em contraponto, o deputado Márcio Jerry (PCdoB-MA) apresentou projeto de lei para incluir explicitamente o termo "ditadura". Assim, o futuro texto viria com uma redação mais abrangente.
Vejamos:
“para punir, com multa ou detenção, de três a seis meses, autores de declarações ou conclamações públicas que remetem a fatos criminosos, tortura ou que incentivam algum tipo golpe ou quebra do sistema político vigente”.
Antes disso, o Ministério Público Federal já havia notificado à Presidência sobre as comemorações e que elas mereciam repúdio.
Arquivo Nacional / Correio da Manhã |
POR UMA ANÁLISE MAIS HUMANA
Positivismo x Jusnaturalismo
O caso Bolsonaro aponta para uma crise ética. Pode o Presidente da República fazer apologia à ditadura militar no Brasil? Segundo a lei, pode. Mas seria um ato discricionário ético? Não seria, diante dos novos rumos do Direito Contemporâneo, um ato imoral? Na boa da verdade, não faltaria ao Presidente um mínimo de sensibilidade aos fatos já proclamados pela História?
Numa reflexão bem básica, podemos dizer que o positivismo é uma escola que interpreta a lei como ela é. Assim foi o que aconteceu com o crescimento do nazismo na Alemanha. Ao juiz cabia a sua interpretação formal, daquilo que estava escrito. Já o jusnaturalismo defende um Direito pelo bom senso e pela racionalidade. Visa a ideia de um direito natural, que precede ao homem. Essa escola de pensamento se viu influenciada por muitos intelectuais como São Tomás de Aquino, Thomas Robbes, Rosseau e entre outros. Esse movimento de pensamento a partir do século XVIII deu o impulso necessário para o surgimento das primeiras noções dos direitos humanos.
Há várias correntes contemporâneas de interpretação, mas cabe aqui um entendimento inicial desse momento crítico do Brasil. Não haveria necessidade de lei, caso a Justiça brasileira realizasse uma breve interpretação analógica acerca da ditadura militar. Caberia a regra do artigo 287 do Código Penal, pois a ditadura militar foi um movimento de atos criminosos. Diante da complexa realidade do ativismo judicial no país, um juiz pode interpretar a seu modo, tanto de forma conservadora ou progressista. Nada disso seria necessário se o Brasil tivesse um Presidente da República comprometido com os valores democráticos e com o que há de mais relevante no pensamento jurídico contemporâneo. Nunca na História do Brasil, desde a sua redemocratização, algo tão estranho ocorreu na República. Como pode alguém relativizar o que aconteceu no período mais horrendo do país?
Num momento tão difícil onde questões básicas da História parecem não significar nada, a arte e a educação surgem como sinais de esperança. Bolsonaro seguirá sendo processado, inclusive junto à ONU.
"A educação é a arma mais poderosa"
Nelson Mandela
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