Sob o céu da Cultura
julho 01, 2018Foto de Simonetta Canetti |
Em meio à crise econômica e política em que se encontra o Brasil, muito se discute se existem alternativas para o desenvolvimento do país. Aos descrentes e desanimados de plantão é preciso reafirmar o compromisso com o diálogo para a construção de caminhos que levem em consideração o povo brasileiro e não os interesses de alguns. Mas como desenvolver pontes se o fosso da desigualdade social só aumenta?
Segundo o livro "O Capital
no Século XXI", assinado por vários pesquisadores, entre eles o respeitado
Thomas Piketty, especialista em estudos sobre desigualdade de renda, 1% mais
ricos concentra 28% de toda a renda no Brasil. Diante desse cenário vergonhoso,
não se pode esperar grandes avanços sem uma real transformação das políticas
estruturais de desenvolvimento. Esse fator é fundamental para aumentar a
igualdade entre as pessoas, único caminho possível para fazer do Brasil um país
decente. Em meio às vozes políticas estranhas com slogans ultrapassados
motivando a intervenção militar, faz-se necessário a instalação de uma
mobilização social mais sofisticada. Se o Brasil deseja ser considerado um país
de fato desenvolvido, precisa seguir o exemplo de países sérios, e não faltam
exemplos a respeito. No livro “Desigualdade, o que pode ser feito” do
pesquisador Anthony Atkinson, há uma
lista de quinze medidas para diminuir a desigualdade, entre elas algumas
alternativas como: taxar os mais ricos, garantir recursos públicos para a
seguridade social e criar políticas públicas de emprego e renda para os mais
pobres. Não se trata aqui de uma visão mais esquerdista sobre a atuação do
Estado, mas de uma verdadeira dimensão cultural capaz de observar o ser humano
de forma transdisciplinar.
Um
exemplo na prática de política ultrapassada é a cidade do Rio de Janeiro. Pesquisadores,
cientistas sociais e estudiosos de segurança pública sabem que a intervenção
federal só aprofundou a criminalidade na cidade. As ações contra a violência
são combatidas pela ideologia da guerra, sem qualquer inteligência tática ou
cooperação com demais organizações. Na verdade, trata-se de um espetáculo
político. Conforme experiências internacionais, as únicas saídas para o
desmonte da criminalidade e da violência são os grandes três fatores: igualdade
social, educação e cultura. Parece
utópico acreditar numa visão mais justa e igualitária quando o país proíbe a
venda de alimentos orgânicos e libera o veneno. Ao mesmo tempo é preciso
compreender que esse não é o entendimento do povo brasileiro e sim de políticos
compromissados com interesses econômicos. Dessa forma, a cultura precisa ser a
ferramenta diária de desmantelamento dessa maneira suja de lidar com a coisa
pública. Como num filme, parece que o passado ainda assombra o Brasil. É um
momento oportuno para reivindicar um papel mais incisivo da sociedade civil nas
organizações culturais do país. Os Conselhos Municipais de Cultura são grandes
ferramentas de participação e podem colaborar para a criação de uma agenda
criativa dentro das cidades. O cerne do problema do Brasil é a instalação
equivocada de uma falsa ideia de que não há solução para o país. Na verdade,
essa é uma compreensão que faz parte de um jogo covarde para que a injustiça
continue.
Por
isso, faz-se necessário crer na cultura, não só como uma pasta simbólica, mas
como a única dimensão possível para desobstruir a via da igualdade, do
desenvolvimento sustentável e da retomada da força criativa e econômica do
Brasil. Para que isso ocorra é necessário que agentes públicos estejam
compromissados para ir além dos quatro anos de mandato. Por outro lado, é
fundamental que os artistas assumam postos de comando nas organizações
culturais no Brasil. Para que volte a crescer, o país carece da participação
efetiva dos produtores culturais. É preciso acreditar, com ações concretas, que
o céu da cultura um dia se abrirá. Para que isso aconteça, os mestres precisam
ser ouvidos. Parafraseando Albert Camus: “Sem a cultura, e a liberdade relativa
que ela pressupõe; a sociedade, por mais perfeita que seja, não passa de uma
selva. É por isso que toda a criação autêntica é um dom para o futuro”.
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